sábado, 23 de junho de 2012

A cigarra e as formigas, de Monteiro Lobato

Em seguida, fizemos a leitura da versão de Monteiro Lobato da fábula de Esopo, escrita no século XX. Os alunos fizeram leitura e interpretação da fábula:

A cigarra e as formigas (Monteiro Lobato)
I - A formiga boa
       Houve uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé do formigueiro. Só parava quando cansadinha; e seu divertimento era observar as formigas na eterna faina de abastecer as tulhas.
      Mas o bom tempo afinal passou e vieram as chuvas, Os animais todos, arrepiados, passavam o dia cochilando nas tocas.
      A pobre cigarra, sem abrigo em seu galhinho seco e metida em grandes apuros, deliberou socorrer-se de alguém.
      Manquitolando, com uma asa a arrastar, lá se dirigiu para o formigueiro. Bateu – tique, tique, tique...
      Aparece uma formiga friorenta, embrulhada num xalinho de paina.
      - Que quer? – perguntou, examinando a triste mendiga suja de lama e a tossir.
      - Venho em busca de agasalho. O mau tempo não cessa e eu...
      A formiga olhou-a de alto a baixo.
     - E que fez durante o bom tempo que não construí a sua casa?
     A pobre cigarra, toda tremendo, respondeu depois dum acesso de tosse. 
     - Eu cantava, bem sabe...
     - Ah!... exclamou a formiga recordando-se. Era você então que cantava nessa árvore enquanto nós labutávamos para encher as tulhas?
     - Isso mesmo, era eu...
     Pois entre, amiguinha! Nunca poderemos esquecer as boas horas que sua cantoria nos proporcionou. Aquele chiado nos distraía e aliviava o trabalho. Dizíamos sempre: que felicidade ter como vizinha tão gentil cantora! Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo o mau tempo.
    A cigarra entrou, sarou da tosse e voltou a ser a alegre cantora dos dias de sol.


II - A formiga má
   Já houve, entretanto, uma formiga má que não soube compreender a cigarra e com dureza a repeliu de sua porta.            
     Foi isso na Europa, em pleno inverno, quando a neve recobria o mundo com seu cruel manto de gelo. A cigarra, como de costume, havia cantado sem parar o estio inteiro e o inverno veio encontrá-la desprovida de tudo, sem casa onde abrigar-se nem folinha que comesse.
     Desesperada, bateu à porta da formiga e implorou - emprestado, notem! - uns miseráveis restos de comida. Pagaria com juros altos aquela comida de empréstimo, logo que o tempo o permitisse.             
   Mas a formiga era uma usurária sem entranhas. Além disso, invejosa. Como não soubesse cantar, tinha ódio à cigarra por vê-la querida de todos os seres.             
    - Que fazia você durante o bom tempo?            
    - Eu... eu cantava!...            
    - Cantava? Pois dance agora, vagabunda! - e fechou-lhe a porta no nariz.             
   Resultado: a cigarra ali morreu entanguidinha; e quando voltou a primavera o mundo apresentava um aspecto mais triste. É que faltava na música do mundo o som estridente daquela cigarra, morta por causa da avereza da formiga. Mas se a usurária morresse, quem daria pela falta dela?

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